Aconchego
Luzes quentes cintilam dentro de lares cujo amansar de dezembro sorri gentil. Há neve lá fora, flocos lívidos tocam os rostos corados e frígidos. Nôe caminha com sua amada Lillra no entardecer pálido, ela guarda em sua feição uma alegria serena. Estão juntos, isso é o que há de mais valioso em suas vidas naquele instante. Seus passos são marcados na neve até que cheguem, enfim, em sua singela casa de madeira.
A ceia iniciaria em breve, por isso deixaram o aconchego das luzes e do fogo da lareira e seguiram sem pressa até o bosque para colher as cerejas mais perfeitas em frescor. Receberiam, também, familiares íntimos, eram poucos, porém, especiais. Avistaram, por sinal, seus pais a espera deles assim que se aproximaram, os casais carregavam duas candeias cada, pois o sol já se punha.
— Deixe-nos ajudá-los com essas cestas — dissera Ordom, pai de Lillra. Ambos sorriam. Todos sorriam. O sorriso era o cumprimento, as boas-vindas. Amavam-se ainda mais quando o frio congelava os pés e, portanto, tinham de cobri-los com meias de lã. Amavam-se quando o cheiro de bolo de frutas amanteigado pairava no ar e as ameixas cristalizadas cobriam o manjar sobre a mesa. Abraçavam-se o tanto que não o puderam fazer no ano inteiro.
Aynile, mãe de Nôe, tocava com excelência o piano que fora herdado de seus pais e que, agora, foi passado à geração de Lillra — que não sabia tocar tão bem. Ao som suave e natalino, conversavam e cantava, sim, cantavam! Em coro e no balanço sutil da noite, a família libertava suas vozes graves e angelicais em um coral amável de hinos sobre amor e generosidade.
Não eram religiosos. Talvez, todavia, fossem. Mas, o que importava era o vínculo em vida, a vida perene que tinham; importavam as dádivas singelas que cultivavam. Dezembro era o mês que lhes servia como um retorno ao íntimo, reencontrando seus olhares infantis, porque na infância o valor da vida está tão somente no significado puro de viver.
Por isso seus olhos brilhavam. Eram pequenas luzes aquecidas pelo amor.