Vestida em damanoute enegrecida
Desperta e dos sonhares esquecida
Na muda escuridão pungente e morta 
Senti certa presença à minha porta
Porém sonido algum, nem vil batida
Ouvi no cumarú que o umbral comporta. 

Decerto estava, pois, eu mui confusa
Deitei-me ao leito lânguido, reclusa
 — Talvez o horário esteja me inibindo
E a minha sanidade se embaindo 
— 
Pensei relenta ao breu d’ngústia infusa
Até mi’a tez prever horror infindo;

Dealvando a face minha no rompante
No umbral ‘tava a presença necromante
Meus olhos em temor se comprimiram
Que às frestas tão mofinas difundiram
A aragem putrefata equissonante:
Os vis silêncios mórbidos se uniram
Ao pranto meu de agrura fulgurante;

A névoa negra logo condensou
E vi que a orla da porta se grisou
Havia, pois, só ela e nada além,

 — Retorna à treva ruim que te provém! — 
Mi’a trêmula voz tola esbravejou
Pujante que meu pânico aumentou

E a súbita coragem fé detém,
Abri com ódio a porta, nada além…
A límpida moldura me espelhou;

Um quadro na parede, mais ninguém… — 
Alívio! À solidão, meu puro amém,
Até que algo em mi’a nuca respirou…

Sara Melissa de Azevedo

Como Escritora, tenho inúmeros semblantes, sempre em busca do lírico, do intenso e do profundo. Como Poetisa, tenho a eterna sensibilidade e a vívida paixão. Como pessoa comum, sou mais uma na multidão em busca de compreender a si mesma. SAIBA MAIS

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